Nada pertence a ninguém!!!
Não permitir que a primavera realce as cores da natureza é o mesmo que fundamentar uma nuvem de carbono e acabar com as sutis diferenças entre as estações do ano. É desejar que a aquarela não ouse misturar outras marcas de tintas para colorir novas paisagens com novas influências, outras visões, outros olhares. Ao querer que o que nos cerca seja sempre igual ao que era quando conhecemos, sem querer, demonstramos nossa incapacidade de lidar com as transformações. Transformações estas que supostamente estimulamos e assim acabamos assumindo o papel do agente que agora condena seu objeto de admiração ao gelo. Congelamento. Não gostaria de amar uma estátua de cera. Nem ter apenas um livro disponível na minha biblioteca. O mesmo programa de TV todo domingo. A mesma música que fala das mesmas ilusões ou desilusões. Ainda é pior quando não somos capazes de assumir o protagonismo daquilo que queremos no mundo. Sinto saudades, sinto falta, recordo quando...
Expressões que jogam o peso do saco sem fundo nas costas do outro.
Por que não faço o que espero daquele que me inspirava?
Por que não sou capaz de plantar e semear uma nova safra de idéias e ideais?
Quando a gente se apega ao passado e não se permite entender que alguns seres sofrem mutações profundas, o tempo vai passando e entupindo a esperança, como se fosse o canal auditivo lotado de uma secreção surda. "Espero que ele (ela) volte a ser como era antes", "Tenho esperança de que me atraia como me atraiu naquele dia em que fez uma surpresa tão linda quando despertei pela manhã".
Preciso dar o direito da pessoa que admiro, que gosto, que tenho apreço de ter suas frustrações, seus sofrimentos internos, suas desilusões graves, seus desbundes, deslumbramentos, seus vícios, suas loucuras e até suas previsibilidades irritantes. Preciso dar-lhes o direito de se expandirem, se retraírem, de se perderem, se encontrarem numa nova, numa antiga, numa boa, numa má, na vibração de Deus ou do Diabo.
Moldar alguém é como escravizar a alma desse mesmo alguém que te fez feliz um dia.
Eu posso ficar o dia todo chorando ou reclamando que o que acontece atualmente não me apetece mais como antes. "Ah como eu gostava de tudo aquilo e hoje não é mais o mesmo" O que não deveria é fincar estacas para que as raízes parem de crescer, pois tirar o direito alheio de forjar, mentir, vomitar, se expressar como bem quiser e até vir a melhorar para si mesmo, não necessariamente para mim, é o desejo estéril de inutilizar e cristalizar a evolução da alma e do espírito alheio.
Eu posso até tecer minhas críticas a ele. Posso não gostar, posso discordar, mas devo aceitar que tem o direito de ir onde quiser, como quiser, com quem quiser, a hora que for, sem que para isso precise de minha autorização.
Dêem liberdade aos pássaros ou contentem-se com os corações empalhados.
No fim, isso é só medo. Medo de não se sentir mais tão familiar com que antes poderia chamar de seu.
Nada pertence a ninguém.
NADA.
( Por Tico Sta Cruz)
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